Transexuais e travestis sofrem com a falta de oportunidades. Especialista em direito homoafetivo afirma que é preciso quebrar barreiras do preconceito
Discriminação, exclusão, violação de direitos, dificuldade no acesso educacional e ao mercado de trabalho. Esses são alguns dos desafios rotineiros enfrentados por pessoas transgênero, transexual e travesti no País. Inclusive, o Brasil lidera o ranking de violência contra trans, segundo informações da ONG Transgender Europe.
A equipe de reportagem do Diário de Aparecida visitou, na manhã da última sexta-feira, 25, a região dos motéis às margens da BR-153, no município. Na oportunidade, uma travesti que estava a trabalho no local relatou sobre a sucessão de dificuldades que enfrenta no dia a dia. Duda, como gosta de ser chamada, tem 42 anos e prefere não dar o nome original. De pele negra, maquiada e escorada no muro de um dos motéis por volta das 9h40, ela comentou sobre a sua rotina de vida. “É uma sequência de dificuldades que a gente enfrenta desde a descoberta da sexualidade até a vida adulta”, destacou.
Ela conta que, devido ao preconceito e alto grau de exclusão, a maioria dos travestis e transexuais não consegue uma oportunidade no mercado de trabalho. “É muita restrição. Mesmo tendo escolaridade e cursos, muitas vezes somos dispensadas por conta da identidade de gênero”, explicou. Segundo o Relatório da Violência Homofóbica no Brasil, publicado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH), a transfobia faz com que esse grupo “acabe tendo como única opção de sobrevivência a prostituição de rua”.
A história de Duda é parecida com a de muitas outras na mesma condição, que sofrem com a discriminação. Segundo ela, com essa idade, por não corresponder à expectativa do mercado de trabalho, que ela considera excludente, a situação de vulnerabilidade das travestis é alta. “A sociedade nos menospreza ao ponto de acreditar que a gente não tem capacidade para trabalhar formalmente como qualquer outra pessoa. Muitos pensam que a gente só sabe fazer sexo”, ressaltou.
Com casa própria em Aparecida de Goiânia, carro, moto e um salão de beleza, Duda afirma que conseguiu tudo por meio de programas sexuais. Por falta de chances no mercado de trabalho, as pessoas trans acabam por recorrer à prostituição. Segundo ela, às vezes ganha R$ 2 mil por mês.
Direito
Chyntia Barcellos é advogada e membra da Comissão Especial da Diversidade Sexual e Gênero do Conselho Federal da OAB. Ela afirma que a exclusão pela identidade de gênero ainda é alarmante. “É uma situação de muita exclusão. Em Goiás, não existe um programa que acolha essas pessoas. É urgente a inserção das trans no mercado de trabalho”, pontuou.
A especialista salienta que, para quebrar a barreira da discriminação no mercado de trabalho, as empresas precisam se capacitar para saber atender à demanda, sem qualquer restrição à identidade de gênero. “Em São Paulo, por exemplo, as grandes empresas têm programas efetivos para contratação de pessoas trans. Em Goiás, não temos nada nesse sentido”, destacou a advogada.
Para trabalhar a inserção dessas pessoas no trabalho, as empresas podem oferecer treinamentos para discutir questões como identidade de gênero, orientação sexual e pautas da população LGBT, voltados principalmente para a liderança empresarial. “Muitas conseguem superar o preconceito, fazem faculdade, mas não conseguem trabalho. Por falta de programas de inclusão, ainda é alto o número de pessoas trans que estão fora do mercado de trabalho. Mas é preciso abrir os olhos para a diversidade”, sugeriu.
A transexual e militante do movimento LGBT Rafaela Damasceno comenta sobre a dificuldade das pessoas trans. “Hoje, mais de 90% das pessoas trans estão na prostituição justamente por falta de oportunidade. Quem sabe num futuro breve a gente consegue romper essas barreiras. Aos poucos estamos conseguindo caminhar e esperamos uma mudança.”
Rafael Freitas
jornalismo@diariodeaparecida.com
Publicado originalmente no Diário de Aparecida em 28/08/2017