Escritórios ajudam empresas a garantir diversidade no trabalho

A inclusão de minorias, na visão de especialistas, não é mais uma questão ideológica, mas necessária para evitar processos judiciais e danos à imagem das corporações

A tolerância às diferenças no ambiente de trabalho contribui à criatividade e reduz riscos reputacionais FOTO: DREAMSTIME

A defesa da diversidade e da tolerância deixou de ser uma pauta meramente ideológica para se tornar uma obrigação no meio empresarial. É com esse pensamento que alguns escritórios de advocacia estão se destacando no combate ao preconceito no Brasil.

Um exemplo disso vem da sócia do Edson Barcellos Advogados, Chyntia Barcellos, que ganhou notoriedade após escrever uma cartilha chamada “demitindo preconceitos” voltada a combater a discriminação no ambiente corporativo. Na opinião da advogada, o maior desafio em fazer esse trabalho junto às empresas é mostrar que a luta por tolerância e igualdade de tratamento, não importando gênero, religião, orientação sexual, raça, etnia ou classe social é uma necessidade de compliance e governança. “O empresário tem que abrir suas portas ao tema. As multinacionais que trabalham com essas questões fora do Brasil já passaram a fazer isso aqui também”, avalia.

Chyntia ressalta que além da questão financeira, com o risco da empresa ser condenada na Justiça Trabalhista a pagar danos morais por condutas consideradas discriminatórias contra seus funcionários, ainda há o risco reputacional caso adote uma postura de não abraçar a diversidade. “A empresa pode acabar sendo exposta nas redes sociais. Por isso, orientamos a um olhar interno para depois pensar no externo, que seria a busca do mercado LGBT, como tem feito marcas tais quais Natura, Avon e Boticário. Essas empresas já tinham práticas internas para funcionários e colaboradores antes de se posicionarem na mídia”, conta.

A especialista em direito penal empresarial do Tozzini Freire Advogados, Ludmila de Vasconcelos Leite Groch, defende que a diversidade também tem um efeito positivo no dia-a-dia da empresa ao criar um ambiente mais propício ao desenvolvimento de ideias criativas. “Peças iguais não constroem um quebra-cabeça, então a defesa da tolerância é uma pauta financeiramente sustentável. A diversidade traz criatividade para a equipe, o que faz muito bem para o trabalho em conjunto”, opina.

Para ela, o apoio a essas bandeiras também faz bem porque gera engajamento com os clientes que se interessam por esse tema. “É um fator para escolha do cliente. Já tivemos duas empresas que vieram para o escritório em razão da nossa defesa da pauta. Esse era um requisito na hora de contratar um escritório.”

Diversas iniciativasO Mattos Filho Advogados, uma das maiores e mais tradicionais sociedades de advocacia do Brasil, também assumiu apoio na defesa dos direitos humanos, exaltando essa pauta já na página inicial do seu website. A sócia das áreas de Seguros, Resseguros e Previdência do Mattos Filho, Camila Leal Calais, conta que a discussão dentro da banca começou em razão de um pensamento pragmático.

“O escritório tem mais mulheres, então observamos se era um lugar bom para elas trabalharem. Olhamos para outras empresas que tinham essa questão e nos Estados Unidos, inclusive, acompanhamos muito os debates sobre diferenças salariais entre homens e mulheres que foram feitos naquele país”, relembra.

Foi assim que surgiu a primeira iniciativa da sociedade, batizada de 4Women, que prevê palestras com a participação de pessoas das mais diversas crenças e posições. “Com essas ações, conseguimos atrair mais mulheres entre as estudantes de direito”, acrescenta.

Depois da primeira experiência, o escritório não parou mais, e começou diversas outras iniciativas com o mesmo objetivo, inclusive se tornando signatário do programa “He for She” da Organização das Nações Unidas (ONU).

“Temos um comitê que analisa questões de igualdade e inclusão, com o planejamento de cada ano. E também temos uma atuação relevante, que é ter dentro do nosso atendimento pro bono um convênio para atendimento de mulheres em vulnerabilidade por conta da violência”, acrescenta.

No dia a diaEm termos de ações concretas, a advogada e consultora jurídica, Maria Lúcia Benhame, explica que é importante que todas as empresas tratem seus funcionários, sejam homens, mulheres, negros, brancos, heterossexuais, homossexuais ou transsexuais, como pessoas. “Quando o empregador contrata uma pessoa trans, por exemplo, a documentação oficial tem que ser feita com o nome civil, mas crachá e o nome na empresa deve ter a sua identidade social, nada mais que o nome pelo qual a pessoa gosta de ser chamada”, destaca.

Benhame ressalta que a empresa precisa tomar cuidado também quando está contratando, para impedir quaisquer acusações de discriminação. “O departamento de recursos humanos precisa ter um treinamento específico para isso, assim como os gestores. Se a diretoria não estiver envolvida, o projeto não funciona.”

A especialista afirma que o processo seletivo deve ser muito bem documentado e ter critérios objetivos. Assim, caso o candidato que faz parte de alguma minoria for preterido, a empresa terá como provar na Justiça que não fez uma escolha baseada em preconceito.

No mercado em geral, Banco do Brasil e Carrefour garantem seguir essa tendência. A instituição financeira, entre outras medidas, criou ouvidorias para investigar discriminação, enquanto a varejista usa uma cartilha para orientar lideranças da companhia a lidar melhor com as diferenças.

Por:

Ricardo Bomfim
São Paulo

Artigo publicado no site do Diário Comércio, Indústria & Serviços, em 24.01.18.

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